18/08/2016

ingenuidade

Existe uma linha que termina onde eu sou. Compasso arbitrário da razão, elasticidade perceptiva, material esponjoso é o recife de corais que separa o que é mar e o que é rio. A nado procuro ultrapassar o que parece ser uma restrição de covardia. Imprudente, ingênua ou corajosa mas inocente, não. Preguiçosa mas não passiva.

Sou inteira e nesta geografia os rios parecem contradizer a terra até que se compreendem como uma paisagem, habitat de animais, tantas partes, tantas mortes e a vida prevalece. Um amor não é a história que se conta, é o que morreu e existiu, não é verbo infinitivo amar, só é presente e é passado, futuro de amor é morte e futuro de morte, vida.

Os erros se acertam como a água que despeja livre no ar e toma o formato do copo. E depois dentro do corpo, gole a gole, se distribui onde é necessária. Existe um sentimento engraçado com um amor que passou, mais até do que saudade é como se eu quisesse agradecer.

Na vida de uma mulher o amor é uma pequena pedra. Nesta complexa geografia, não é uma montanha difícil de descobrir nem mesmo um precipício medonho, é um acidente. Uma lasca de rocha, um minério esquecido debaixo da terra. Embora seja pequena, uma pedra. A montanha é o amor de si, o precipício é a mulher não abdicar e sobretudo amar-se.

Eu sei que sou a mesma terra que desagua em mim rio mar areia vento e fogo fenomenal ainda assim sou também olhos que fotografam essa paisagem como sendo parte da paisagem esses olhos são e não são. Olhos que cortam as linhas e criam ilusões e também aprendem, através das lentes, quais linhas não são e podem ser quais todas as linhas que podem ser, podem ser, podem ser, podem ser ser mar e ser rio e céu ser cais e lua sol e pilares conchas e outras imagens repetidas de sonho.

Agosto é um mês grave. Talvez janeiro seja mais agudo, estridente. É o inverno, na verdade, perturba a resistência, as plantas se recolhem. Se contorcem, desistem. Dá vontade de seguir a natureza, no meio dos prédios a natureza é pouca. Eu, no entanto, sou inteira. Sou urbana mas não quero ser. Consigo ser natureza. Consigo muito mais, porque eu seria cimentada? 

Tomo um chá, me acalmo, ouço música. Ainda preciso despertar. 5h43 é muito cedo. As coisas não são minhas mas estar ao redor de coisas é importante para se tornar adulta. Nego as coisas, quero pouco, sou pouca, sou inteira. Sou comum. Uma sombra de mim é o que acham de mim, na indefinição da falta de luz dessa imagem eu sou, indefinida, falta, luz, imagem, sou, achem.

Sou desacreditada da minha verdade que é dizer palavras e escrever imagens porque nunca escrevi uma palavra de verdade. Palavra de imagem. O momento é extenso, a paisagem é um pouco desejo do olho de ver mais, de ser mais, de engolir o que não é, e

zeligarah