"Sobrevoaram
o vasto hangar de chegadas e partidas interplanetárias, um mundo despovoado e
alucinante, de construções gigantescas arredondas, encimadas de fusos brancos,
as pontas espetadas lá longe, no espaço, maciças e fantasmagóricas, assentes na
espectral luminosidade de invisíveis projetores." és um bicho bonito e eu venho habitar-te;
O Aquário, Alice Sampaio
Não me importo em saber como surge
a paixão. mas ao ler outro que parece eu visto tais óculos que me fazem
enxergar nítidas miragens alaranjadas que piscam a refletir meus pensamentos em
um espelho que guardo na palma da mão.
piscam estes farois de luz agressiva
eu você até a noite que já estava próxima. como abrem meus olhos a falta de luz
meu tato abre-se como tentáculas ventosas, como couro de bicho.
o bicho que nasce na minha pele é
você? não poderia ser meu...? E como ninguém fez questão de habitar tal bicho
porque vê-lo dançar e correr e nadar é deixá-lo voar pela madrugada
impertencente encontrar estrelas em outras dimensões tão simplesmente como
tropeçaria se as pernas lhe fossem de quem espera; buscar é esperar sem nada
por encontrar,
uma aventura real é ainda uma
simulação de acidentes, o cálculo é aquém para aqueles que ultrapassam a si
mesmos ao ultrapassarem-lhes o forte acaso.
-é na
minha pele o bicho que nasce você
-eu
- não queremos ser salvos. aceitamos
esta demente diversão de ver-nos a própria morte em cada passo imaginado dentro
da pupila ruiva e escura da coruja que chamam Sapiência
- Sempre o retorno...
-se ao menos pudesse voltar às
futuras possibilidades que não caminhei, uma outra viagem no mesmo caminho
- é sempre o mesmo caminho
- e sempre outra viagem
- e queremos ajuda
- sim e não
- não se pode entregar tudo nem
abraçar tudo além do que cabe em seus braços na verdade não é mais possível, um
abraço é um tesouro como um poema escrito em papel de seda há séculos guardado
no escuro túmulo de algum rei e quando revelado fracionado instantaneamente
como a fotografia que teve pressa
- na sala escura é o útero assim
como a lua nova
- o putero
-útero
-o útero é outra dimensão não é
exato um órgão por assim dizer feminino ele não pertence à mulher
- tirem seus úteros do meu rosário
- seria um padre a dizer?
- pertence diante dos homens,
diante dos homens o útero dentro do meu corpo pertence a ninguém mais do que a
mim - e segurava a barriga com uma das mãos grávidas - diante do estado, diante
da igreja, diante de todas as leis e da ciência, pertence a mim somente. ao
lado de meu filho, de meus genitores, deste genitor feliz desta criança que
nascerá, ao lado de meus amigos, de minhas irmãs, minhas amigas e de meus
irmãos, diante do sol e das outras estrelas e diante da lua e de todos os
bichos e plantas, pelas águas, pelas terras, pelos ares e pelo fogo, o meu
útero é impertencente
Uma grande pausa foi ocasionada pelo horário do
fechamento da eletricidade essencial para escrever no computador depois o start
uma pequena chave dentro de uma caixa de sapatos cheia de chaves e tampas que
iam virar instrumento musical como sinos e pequeno tamborins.
o bicho faz voltas ao redor de si quando se sente a caça
(novamente as grades douradas,)
tremeu o seu entendimento de bicho quando ao tentar
um elogio o homem que parecia o homem que bateu em seus cachorros disse
-você parece um animal de zoológico
assim como o homem parecia outro homem pois são
ambos homens aquele bicho parecia outro bicho porque animal nenhum é animal de
zoológico apesar de ser o zoológico o lugar dos animais para uma antiga língua
humana se fossemos estudar as palavras
(nada dizem as palavras)
a mulher
sentada em frente à jaula da onça via os seus olhos que outros viam os olhos
fazem voltas
olhando aquela sala triste de obrigações a mulher
lembrou-se quando era menina e estudava na igreja a catequese e sabia ler a
bíblia como verdade e percebeu que as verdades de sua vida era como o livro de
jó as cartas de amor não lhe emocionavam mas sim o amor lhe fazia chorar quando
sentia verdade. não era medo porque o
homem que parecia o homem que bateu em seus cachorros era incapaz de bater (em
cachorros).
a dimensão da lógica é pouca, estreita eu grito sobre essas frágeis paredes de
alumínio e o meu sopro cria este fim a destruição dos óculos que me fazem
enxergar nítidas miragens pois quero encher meus olhos de areia e ver deserto
infinitamente árido
-GRITEM SE FOR PRECISO!
Equação algébrica
Falar em ouvidos outros ouvidos
Vivo por viver
Pelo vivo viver
Certeira ingenuidade
(para a criação é preciso uma santa
afirmação
a criação é o bem e o mal, é preciso)
minha?
Ao menos você se ouça
Esse inferno que criam olhos
mentindo
Qual a diferença entre tais portas?
Algumas indizíveis
Outras impassáveis além de sonhar passá-las
Mesmo quando choro
Mas quando choro sozinho
Quer passar
O riso quer
E Sim!
Palavras são idiotas.
Influenciáveis são os rios assim como a terra que
lhes cercam as pessoas dizem acredito numa coisa sem se dar conta de quantas
outras pessoas acreditam em tantas outras coisas. eu mesma cuspo na cara do
amor que me alimenta sumo azedo da pitanga madura, os feitiços que lanço são os
mesmo que me alcançam, os meus olhos somem nos seus olhos quando sumo aparecem
dois
-a resposta está incompleta – o professor
universitário tentava explicar polissemia reduzindo as obras à palavras
(como são estúpidas as palavras)
Acredito que não Acredito
por que sou um animal de zoológico e o que mais
posso ser se não romper estas grades que protegem os outros de enfetiçarem-se
sem olhos melhor viver cegar os próprios olhos de milagre de barro e então
curar-se com água autonomamente
-eu não quero mais transar com você
-não é só sexo
-não é
-só
-não
-é
-sexo
Se eu não mostro é meu?
Segredo
Erro
Mentira
trovejou
a natureza instaura toda verdade e nenhuma verdade.
o caminho da sabedoria é esta infindável dança macabra, os pés sobre as brasas.
suportar, encarar todo o não significado e todo significado ao traçar uma linha
num papel, escrever palavra pós palavra e gestos e cores, ordenando o caos a
desordenar-me em calma; o significado é escasso é monótono:
amor e ódio e paz e cólera e dia e noite e sim e não
e todos os seus tons, variações da mesma coisa como as palavras feitas de sons
e letras.
Amortecida de cansaço ouço o ruído da ventilação na
plataforma do trem. O rio está igualmente amortecido diante de mim diante de
toda essa fossa paulistana. Formigamento
-desculpa – comunicam-se as formigas quando se
esbarram nos caminhos
-sobre o que fala o poema ? – o professor
universitário insiste em tentar explicar para não aprender com seus alunos
Estes acadêmicos dissecam a poesia sem primeiro
vê-la morta. Abrem-lhe com o bisturi sem coragem de mata-la primeiro e ficam
todos insones ao ouvir estes gritos. Tenham cuidado com o amor, porra.
(que mais
posso amar senão o enigma?)
sim
Quero falar vou ensinar minha língua aqui sem me
explicar eu vou me traduzir para filtrar esta água cheia de meus desejos e
finalmente ver a transparência nas suas palavras nesta terra de ninguém que
aqui proponho: (vejamos se é possível drenar os desenhos da imaginação a ponto
de se tornar bebível um líquido cheio de microorganismos agigantados ou fumar
um enrolado de folhas úmidas ou comida feito serragem)
Vou rascunhar para você acompanhar minha busca por
um filtro legítimo, perceba este momento como quando o mágico lhe deixa
analisar suas cartas –
Eu quem escrevo eu
Eu quem leio eu
primeiro
não me direciono a nada mais porém
quem a isto se atentar
é comigo amigo desta língua que invento
fala a minha língua
eu com você
decifram
o não dizer
Se existem bolas maciças de aço e bombas a explodir no fundo do mar, assassinatos
e massacres
Se existem cerâmicas e tecidos artesanais de seda
o silêncio obrigatório é sufocante mas quando não e
é livre é livre até ser interrompido
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zeligarah |